O motorista que transformou a alegria em estilo de vida

Aldener Maciel da Silva, 57. Com ele não tem tempo ruim. Também conhecido entre os colegas como “filhote”, ou simplesmente “lindo”, é com muito bom humor e disposição que este motorista da Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM) transporta leveza para o dia a dia da instituição. O sorriso não falta nem quando o trabalho se estende além do horário de expediente. O segredo da alegria? Ter amor pelo que faz. “A Defensoria ajuda os mais necessitados e é isso que eu mais gosto daqui”, diz.

Um dos mais antigos motoristas da Defensoria, Aldener está na instituição desde 2010, há 12 anos, quando deixou para trás as ambulâncias do Hospital Pronto-Socorro 28 de Agosto. Sim, ele já foi motorista de ambulância no maior pronto-socorro de Manaus. Por uma década levou sob sua direção a vida por um fio de muitos pacientes. E lá se vão 22 anos de serviço público.

“No hospital, eu dirigia ambulância, na urgência e emergência, era piloto de fuga lá (risos). Lá era uma loucura. Doente, né, tudo tem que ser urgente. Mas aqui não é muito diferente, não. E a gente, às vezes, entra em locais perigosos para chegar onde o povo está. Entra em ocupação – ontem fui a duas ocupações”, compara, se referindo aos riscos e à agilidade necessária para guiar os carros da Defensoria em serviços urgentes, como a entrega de documentos judiciais ou o transporte de servidores e defensores para atendimentos à população.

Ponto comum entre o trabalho nas ambulâncias do hospital público e o da Defensoria, a missão de prestar assistência à população dá sentido ao dia a dia de Aldener. E por isso, ele diz, faz questão de manter o bom humor.

“Eu gosto de ajudar as pessoas e lá [no hospital] eu me sentia muito bem em ajudar os doentes. E hoje é na Defensoria. A gente ajuda os menos favorecidos. Gosto daqui, porque é outro lugar onde é possível ajudar a população”, diz.

Antes do serviço público, já havia feito de tudo um pouco. “Fui picolezeiro, padeiro, motoboy, lavador de carro”, conta, com orgulho. E aí, imagine quantas histórias para cada profissão…

Dia a dia

Não tem moleza, não. O expediente começa às 8h e, às 8h05, conta Aldener, já está indo para as ruas. Oficialmente, o trabalho vai até às 14h, mas como as necessidades da população não têm horário, há dias de se estender um pouco mais, dependendo da necessidade.

“Às vezes, tenho 4, 10, 11 corridas por dia. Mas já teve dia em que fiz 18 corridas. É quando tem incêndios grandes, como aquele do Educandos, enchentes, essas coisas. A Defensoria tem que estar presente. No dia a dia, transporto documentos, materiais, funcionários e muitas vezes viajo para os municípios do interior”, afirma Aldener.

Quem é “sorteado” com Aldener nas saídas a serviço, leva de brinde, logo de cara, um “bom dia” com gosto, acompanhado de largo sorriso. Ao longo do caminho, sempre vêm junto uma história curiosa de Manaus e suas figuras, um comentário divertido sobre algo do dia e um “meu lindo”, “minha linda”. Se você precisar de uma ajuda a mais, ele está à disposição, e se tiver que esperar mais do que o programado, não tem preocupação. Também é daqueles que não fica dentro carro. Sempre procura se envolver e ajudar nas ações. E, assim, as missões de trabalho ganham um ar mais leve.

O melhor são as pessoas

Aliás, para Aldener, o que há de melhor no trabalho são as pessoas. “Os servidores, os defensores, me tratam muito bem aqui. Me sinto respeitado e reconhecido. Meus melhores amigos estão aqui na Defensoria. Os defensores são meus “filhotes”. Amo eles”, brinca.

São pessoas como o gerente de Transportes, Oswaldo Araújo da Silva Júnior. É para ele que todos ligam quando é preciso fazer serviço externo. “O Oswaldo é um dos melhores líderes que eu já tive na vida. Ele não é chefe, é um líder e isso é muito bom para a gente. O chefe, ele manda, exige. E o líder luta junto com a gente”, elogia Aldener.

O lado mais difícil, diz o motorista, é o trânsito de Manaus. “Se fosse mais tranquilo, seria ótimo. Às vezes fico meio estressado. Dá um ‘odiozinho’ de leve, tá com pressa e não consegue chegar, falo um ‘nomezinho’ de vez em quando”, diz, entre risos.

Momentos marcantes

Com tantas saídas diárias e 12 anos de estrada na Defensoria, Aldener coleciona muitos momentos marcantes. Alguns felizes, outros nem tanto. Um que tocou o coração do motorista ocorreu durante um atendimento no bairro Mauazinho, na Zona Sul de Manaus, quando viu uma família passando fome e, por coincidência, estava com um “rancho” dentro do carro.

“Era Natal e um menino veio e me pediu R$ 1. Peguei o rancho e dei para aquele menino. Todos os meses, distribuo cinco ou 10 ranchos e, nesse dia, tinha ficado um dentro do carro. Estava em um atendimento da Defensoria e o garoto ia passando, ele bateu no vidro, e pediu um real para comprar pão. Me lembrei que tinha esse rancho e dei”, registra.

“Perguntei onde ele morava e levei lá. Era muito pobrezinho onde ele morava. Uns 11 anos de idade ele devia ter. Nunca esqueci. Ele ficou muito feliz e a mãe dele disse que Deus mandou um anjo levar esse rancho para eles. Acho que eles não tinham nada para comer naquele dia”, conta.

Em outro momento, Aldener teve medo. “Uma vez fui deixar uma intimação numa invasão, era de pensão alimentícia. Veio a mãe do ‘moço’ e ela disse que ele não estava. Eu pedi para ela receber a intimação e foi quando ele veio lá de dentro da casa com um machado na minha direção. Aí, liguei para o 190. A Rocam [equipe da Polícia Militar] foi lá e levou ele preso na hora. Foi um sufoco”, lembra.

Sobre situações engraçadas, ele diz: “A minha vida já é engraçada. Onde chego, já animo. Então, não tem uma situação específica engraçada que eu lembre”.

Escritório? Jamais!

Como motorista da Defensoria, Aldener circula em todo tipo de ambiente, da invasão até o gabinete do desembargador, e confessa que adora a diversidade de locais e pessoas.

“Hospital, presídio, Câmara Municipal, visita de atendimento psicológico, assistencial…Amo todos os dias estar em lugares diferentes, falar com todo tipo de gente. Essa é a minha vida, ajudar aos próximos. Amo contar histórias, conversar com as pessoas. Onde eu chego é alegria, é fazendo amizades novas”, comemora.

E se aparecesse uma oportunidade de trabalhar em um escritório? “Eu não quero, de jeito nenhum. A minha vida é a vida de um pássaro, é livre. Eu gosto de ficar livre, não gosto de ficar fechado em lugar nenhum, trancado”, afirma, sem pestanejar.

Mudanças

Ao longo de seus 12 anos de Defensoria, Aldener pôde acompanhar algumas transformações e diz que a instituição cresceu muito desde sua entrada.

“O atendimento melhorou 100%. Tem mais trabalho do que antes. Cresceu em todos os sentidos. Tem mais núcleos, está mais estruturada e tem maior número de assistidos. E muito mais defensores. Isso acaba dando em mais saída para nós. A população ganha com isso, com certeza”, pondera.

Família

Aldener é “manauense, filho de manauara”, como diz. O apelido de “Filhote”, diz ele, vem do fato de chamar a todos pelo codinome, costume que tem desde que os filhos nasceram. “Chamava tanto os filhos, quanto os amiguinhos deles de filhote. Aí ficou filhote para todos”.

Tem dois filhos engenheiros, Jean Felipe, de 34 anos, e Pedro Henrique, de 32 anos; quatro netos, Gabriel Henrique, Ísis Rocha, Miguel Henrique e Helena Rocha, de 10, 8, 5 e 2 anos; além da esposa Rosimar. “Eles são minha vida”, diz.

Estratégia da simpatia

E a simpatia? É uma estratégia para conquistar e quebrar o gelo, confessa. “Faço amizade muito rápido, dou bom dia, estou sempre alegre, com um sorriso no rosto. ‘É muito lindo, filhote’, eu digo. A pessoa já ri, e aí a gente vai embora. Chamo todo mundo de lindo. É uma das minhas estratégias. E as pessoas gostam disso. ‘Oi, minha princesinha linda, meu príncipe lindo’. Aí já quebra o gelo”, conta, entre risos.

FOTOS: Clóvis Miranda/DPE-AM e Acervo pessoal

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